sexta-feira, janeiro 28, 2011

Do Afeto

Atendendo ao pedido de Érika Ramos

Ela andava pelas ruas à procura de seu noivo perdido. Onde ele se meteu? Não parava de se perguntar.


Nunca mais o viu novamente.

A gente ia se casar no ano que vem, lamentava a bela moça.

E quando mais os dias passavam, mais ia perdendo as esperanças e mais o seu estômago ficava gelado, mais a ansiedade aumentava e mais ainda ficava nervosa. O que poderia fazer?

Procurou o carinho de sua mãe. A mesma mãe com quem havia rompido relações em nome de seu ex-futuro-marido. Há meses não se falavam e ela já estava com saudade.

Quando chegou, eis a situação. Sua mãe morrera há uma semana.

Ela chorou e odiou toda a sua família por não ter comunicado a morte da pessoa que ela mais amava naquele momento. Foi para uma praça distante. Era um local maltratado, feio e sujo. Ela gostava de ir para lá de vez em quando, pois julgava que aquela praça acabada e esquecida se parecia muito com ela.

Lá ela marcou um encontro com a sua melhor e única amiga. Chegou adiantada na expectativa de ter alguém para desabafar, para chorar nos ombros e descarregar as mágoas, mas a amiga não apareceu.

Ligou para o telefone dela, mas não houve retorno. Ligou para outras pessoas, mas elas não informaram nada. No final, conseguiu com o pai da amiga a triste informação:

Sua melhor amiga fugiu com o seu noivo.

Desesperada, ela já não tinha mais para onde ir, já não tinha mais amigos, já não tinha mais noivo e nem família. Começou a freqüentar assiduamente aquela praça feia e suja e desenvolveu um afeto por um cachorro que ali morava. Brincavam, comiam e se divertiam ali.

Um belo dia, o cachorro foi atravessar a rua e morreu. Mais uma dor para o coração daquela pobre garota que sofria de afetos não correspondidos.

Cansou-se e resolveu voltar para casa e se desculpar com a família. Ao chegar, viu que já não morava mais ninguém lá, estava tudo vazio. Pelo visto eles se mudaram e nem me avisaram, pensou.

Porque deveria sofrer tanto? Perguntava-se. Porque sempre que encontrava alguém para amar, ela tinha de sofrer por isso?

De tanto chorar e pensar sentada no banco velho daquela praça, sem ter mais quem amar, ela percebeu que seu afeto não morreu: adquiriu um grande apego por aquela praça feia e suja. Gostava das árvores, da calçada rachada, dos mendigos e cachorros sujos que ali passavam.

Percebeu que não importa o quanto sofra com a perda de algo ou de alguém. Sempre haverá alguma coisa nova para se amar. Ao notar isso, riu de si mesma e percebeu o quanto pode aprender com os momentos de dor.

Foi para casa, na intenção de voltar no dia seguinte. Só o que não percebeu foi que, quando ia embora, dois arquitetos estavam ali planejando a demolição da praça para a construção de um novo e próspero condomínio residencial.

3 imaginações a respeito:

Érika Ramos disse...

ADOREI! Mtooo obrigada Rodolfo....ficou belíssimo, era o tipo de texto que eu estava querendo ler. Sabia que vc dava conta! Ficou bom mesmo...parabéns! Vc é ÓTIMO!!! Te adoro...Beijos

Tereza disse...

Filho do céu, vc é foda!

Alice Mattos disse...

Caramba, que bosta...
Até a praça!

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blog criado em 23 de Julho de 2009

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